A importância de
Mestre Pastinha para a Capoeira Angola
O arauto da não
violência
O pai da Capoeira
moderna
Fala-se em Pastinha como um mito distante algo
incompreensível ou que precise de uma tradução para que seu legado seja compreendido
pelas novas gerações.
A capoeira até o início do século
vinte era praticada na rua, ou melhor, a céu aberto. Como uma manifestação
espontânea que acontecia nos momentos de folga do trabalho escravo. Assim sendo
sua transmissão ocorria naturalmente sem qualquer preocupação didática. O
conhecimento era incorporado pelo convívio com o iniciado que a praticava
nessas ocasiões e assim disseminava-se seu conhecimento.
Após a abolição da escravatura,
os escravos, naturais praticantes e criadores da Capoeira. Perambulavam sem emprego ou qualquer condição
digna de sobrevivência. Nesta época aqueles que se destacavam pelas suas
habilidades físicas, conhecimento de luta e valentia começaram a ser
valorizados e eram contratados por ricos comerciantes e políticos para fazerem
sua segurança.
Nesta ocasião o conhecimento de
Capoeira teve grande destaque, e passou a ser transmitido por iniciados a grupos fechados que a praticavam como luta
feroz de imposição física acompanhada de
armas brancas. Esses grupos se espalharam principalmente pelo Rio de Janeiro,
sua violência extrapolou todos os limites da lei e do convívio social. Sem a possibilidade
de uma vida em sociedade, foram perseguidos e caçados seu conhecimento passou a
ser tratado como arma mortal nos códigos de lei, bem como passível de severas penas de prisão.
Foi exatamente nesse momento que,
pela primeira vez, o conhecimento de Capoeira foi sistematizado e transmitido
em grupos fechados exatamente pela forma como esses grupos se organizavam e
preparavam suas estratégias. Por
muitos anos permaneceu o estigma de violência e agressividade gratuita ligada à
Capoeira.
Bem, aí chegamos a Pastinha. No
início do século XX ele se deu conta da importância do conhecimento da Capoeira
e entendeu que ela somente seria novamente valorizada e reconhecida se a
violência e a agressividade gratuita desaparecem, fossem banidas de seu
contexto. Nesse momento a Capoeira ainda
era considera arma mortal e seu uso passível das penas da lei.
Pastinha também deu-se conta da
importância do conhecimento da Capoeira para a valorização e reconhecimento da
identidade de seus praticantes ex-escravos afro descendentes. Da grandeza e
profundidade de elementos étnicos e culturais integrantes de sua expressão portanto
fundamentais para a formação e afirmação, principalmente, dos excluídos e
discriminados, que haviam perdido seus referenciais de identidade. Ele afirmou
o valor e a realeza de sua origem através da integração dos elementos rituais
que se manifestam através dela, com isso projetando uma dimensão sobrenatural
ao seu acontecimento.
Tornou-se figura catalisadora das
idéias que fundamentaram a concepção da Capoeira Angola, e os principais
capoeiristas de sua época lhe delegaram a missão de conduzir a pratica da
Capoeira para as futuras gerações.
Praticá-la em local fechado,
através de praticantes interessados em defender sua identidade étnico cultural,
com o propósito do reconhecimento de sua importância como elemento formador dos
indivíduos, no sentido da afirmação de seus valores. Utilizando
uma das mais complexas manifestações da cultura dos ex-escravos, afro
descentes, fundindo elementos religiosos a Capoeira retrata deuses, guerreiros e vadios de toda a
sorte, características gerais de um povo, nela todos os arquétipos deste povo são
revividos através dos elementos rituais que permitem sua criação e manifestação.
O formato bateria, roda, coro, jogadores,
com a definição dos instrumentos que compõem a bateria sua disposição e
quantidades no recinto da roda de Capoeira Angola, ficaram consolidados a partir de mestre
Pastinha. O banimento da agressividade gratuita trocada pela astúcia, pela
perspicácia dos jogadores, o sentido brincalhão e debochado evocando figuras do
imaginário popular para se manifestarem através dos jogadores construindo essa
grande ponte entre o passado e o presente que se materializa quando todos os elementos
rituais se conjugam, aí nesse instante sim, os ancestrais se manifestam e o
verdadeiro sentido da Capoeira Angola se perpetua.
Dessa circunstancia é que pode-se
dizer que surgiu a primeira escola e grupo formal de Capoeira, a valorização de
seus elementos culturais e o caráter de celebração. A exclusão da agressividade
gratuita, da violência pela violência caracterizam a Capoeira Angola de Mestre
Pastinha, que vem sendo sustentada nos dias de hoje principalmente por Mestre
João Grande e seu aluno devotado Mestre Moraes.
Esse é exatamente o inicio do
ensino sistematizado, em local fechado e com o objetivo de formar indivíduos
capazes de tornarem manifesta a tradição cultural dos afro descentes,
ex-escravos, agora cidadãos livres, dignos e imbuídos de grande conhecimento de
suas origens que reconhecem e afirmam seus valores.
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